29 de abril de 2008

A CULPA É DA HUMANIDADE (OS CÉREBROS DA DESTRUIÇÃO MASSIVA)



CAPA (TEXTO):

A degeneração das mentes prolifera… entranha-se na civilização e lentamente infecta as suas vítimas com uma mistura apodrecida de despreocupação e apatia. A total aniquilação das consciências avança sorrateira pelas sombras sem que a maioria lhe ponha os olhos em cima, e ao fundo, num horizonte de aço e fogo, tornam-se perceptíveis as gargalhadas malévolas que essas marionetas desbocadas lançam sarcasticamente ao verem os seus desejos malignos a serem cumpridos sem objecções que se oponham.

Opressores que pelo poder são possuídos, ex-humanos que pela avareza foram enfraquecidos, novos seres mecanizados ao descontrolo submetidos, criaturas que se rejubilam com a miséria dos outros, ansiando instintivamente por um fim declarado da liberdade onde pouco mais existirá para além das ruínas deixadas por esta guerra da obscura ganância humana…



CIVILIZAÇÃO CORROMPIDA

Muito há a dizer da complexa teia de criação/destruição denominada de sociedade humana onde somos forçados a coexistir, muitas palavras existem para demonstrar o escárnio e desprezo que tão consequentemente se pode ter pela entidade biológica e social que historicamente se regeu pela escravatura das mentes dos indivíduos que a ela pertencem. Mas a verdade é que poucos são os argumentos que nos permitem perceber o porquê disto tudo, quais as razões de sermos seres que parecem ter sido forjados com a mais pura essência de ódio e arbitrariedade apocalíptica por tudo o que nos rodeia? Onde habitam as justificações para as frágeis e ténues relações hierárquicas entre pessoas que parecem dar um poder intransigente de controlo àqueles que o usam simplesmente para se regurgitarem na desigualdade com toda a sua arrogância característica?

Não é preciso deambular muito por entre o espectáculo de atrocidades que se tornou a humanidade (principalmente a sua facção “modernizada” e contemporânea) para percebermos que estamos perante uma enorme lacuna prestes a entrar em colapso com tantos erros que foram sendo acumulados ao longo de um vasto período histórico, e como tal somos forçados a pensar que a evolução converge fatalmente para um cataclismo inevitável que de certa forma foi premeditado pela astúcia que o humano aparentemente tem para fechar os olhos e as consciências quando chega o momento de tomar decisões que põem em risco o planeta e a “ordem” social, por mais cuidado que se deva ter com este último termo.
E porque realmente temos de tomar precaução ao mencionar algo tão complexo como a “ordem social”, ou o que esta aparentemente simboliza, convém termos em conta o que representa o nosso papel como indivíduos nessa suposta “ordem” social, e não será com muito custo que iremos observar que esse termo limita-se a ser confundido com o da “repressão”. Ou seja, a “ordem” social que tão levianamente é mencionada pelos supostos dirigentes despóticos das comunidades humanas como sendo um objectivo primário a ser atingido não passa de um truque de ilusionismo e controlo de massas. Perante um lúcido realismo dos factos concluímos que a relação entre o indivíduo e os sistemas sociais são o de inimigo, e isto porque o simples facto de nascermos nessas (des)organizações sociais, na maioria dos casos, é por si só um acto que nos remove a liberdade que poderíamos possuir, tanto que para complementar essa remoção de liberdade seremos expostos ao longo da nossa existência a pressões contínuas para que não consigamos pensar por nós próprios, para que sejamos marionetas de uma repressão orquestrada cujo falso intuito teórico é o de haver concordância e entendimento entre as pessoas. Porém, o que se sucede longe está dessa teoria, e quando um indivíduo pretende alcançar a dependência ideológica do que será a sua interpretação de liberdade na vida de um modo prático, juntando esforços conjuntos com um ou mais grupos em livre associação para alcançar esse fim, o Estado, ou outra qualquer forma de repressão comunitária, age prontamente de modo a que esses esforços sejam obliterados, mesmo que os meios utilizados para atingir a dependência ideológica aliada a uma forma prática de acção não impliquem qualquer tipo de vínculo destrutivo para com as pessoas em geral. A menção de “ordem” não passa de um veículo para o uso injustificado da repressão, o obscurantismo é a mais letal arma que os sistemas sociais vigentes possuem de modo a que se perpetue uma desnecessária situação de desequilíbrio entre os meios de sobrevivência que nos põem à disposição. A democracia, suposta pregadora da proporção devida do bem-estar da civilização, possui um imenso arsenal que tem como objectivo provocar a cegueira dos seus elementos de modo a que estes não consigam escapar à condição de servos que têm de obedecer desde a nascença. Não nos é fornecida qualquer opção ou critério de escolha por meios pacíficos e voluntários, sem o uso da resistência e do inconformismo resta-nos a mera escravidão cega por morais que foram esquecidas na concepção de novos fins malignos e capitalistas, e é neste importante momento que nos cabe fazer a questão… o que realmente pretendemos para nós e para todos aqueles que nos rodeiam? Será que a cumplicidade conformista com a estrutura que nos aprisiona faz alguma lógica? É realmente nosso o intuito de permanecermos resignados à sociedade obsoleta dos tempos modernos?
Se todas estas questões permanecerem na irrelevância e nas sombras da despreocupação continuar-se-á a manter uma situação benéfica para os usurpadores terceiros que nos vêm como instrumentos inanimados e catalogados, é perante a estagnação de novas ideias de resistência que inquestionavelmente prosseguiremos a produzir em demasia sem levantar questões do porquê, para quem ou para quê, mantendo da mesma forma um ciclo onde nós mesmos somos o combustível deste mecanismo, por meio de uma imposição forçada a valores de consumo que vão muito para além de qualquer tipo de necessidade real. Como tal, e praticamente sem termos escolhas, somos inseridos num mundo social onde domina uma vontade alienada pelo consumismo irreflectido, uma dimensão onde tudo se tornou descartável e sem significado algum, onde se continua a observar a obediência dos impulsos causados pela necessidade desmesurada de consumir algo. E por mais óbvio que seja salientar, as grandes alimentadoras desta condição que a médio prazo se pode revelar irremediável são as empresas e indústrias que, na sua actividade e produção, não olham a meios para alcançar os fins que infelizmente são sempre os mesmos, e dos quais se citam o poder imperialista e a acumulação de capital, insistindo-se, no processo, em menosprezar e ludibriar as consequências causadas por esses fins. São nefastos os meios que a indústria usa para “zombificar” os seus súbditos ao consumismo, obrigando-os a uma exposição exagerada à propaganda que, para além de ser enganosa, provoca nos mais desprevenidos uma necessidade impensada para absorver e adquirir os produtos impingidos pelas respectivas multinacionais. E vejamos o que, em troca do dinheiro que avidamente nos extorquem e que só por si é um veneno, esses impérios da ganância nos têm a oferecer:
Poluição ambiental, exploração laboral (infantil incluída), problemas generalizados de saúde (devido à já referida poluição e ao uso de químicos nocivos nas mais variáveis vertentes industriais), destruição da camada do ozono, desequilíbrio climático, propagação do efeito de estufa, dizimação de animais e da natureza vegetal (substituída por campos de cultivo artificiais e infernos citadinos forjados maquinalmente a aço, cimento e alcatrão), tal como o recrutamento forçado dos supostos indivíduos ao “exército” da inconsciência e ignorância, que por sua vez perpetuam todos os danos prejudiciais acima referidos.

É a crescente vaga de consumo de produtos industriais por parte dos consumidores pertencentes às sociedades mais desenvolvidas (que alcançam um estado de quase, se não na sua totalidade, dependência psíquica para com esses produtos) a verdadeira motriz que incita as multinacionais a desprezarem todo o respeito que deveriam prestar para com as principais vítimas afectadas por elas, das quais se pode citar a natureza e as comunidades humanas e animais que estão dispersas pelo planeta. É a necessidade perpétua, e que tem vindo a aumentar descontroladamente, de satisfazer a voracidade consumista das elites com o intuito final de acumulação monetária que induz essas mesmas industrias a escravizar a natureza como se o humano fosse deveras o seu proprietário exclusivo, extraindo-lhe os recursos até à escassez e tendo somente em conta o lucro que essa extorsão infame poderá trazer, qualquer consequência que dai advém só é tida em conta quando o bem estar humano, e exclusivamente o do humano, é afectado.
Estamos perante a insanidade capitalista que se vai disfarçando por entre razões que ninguém realmente se dá ao trabalho de explicar de modo coeso, e é devido a isso que nos encontramos nas circunstâncias de tremenda fragilidade da civilização e do planeta, preferimos entregar o futuro nas mãos de pessoas e associações de pessoas que foram possuídas pelo desespero de adquirir o poder e pela loucura do falso aprazimento que é o domínio e o controlo infundamentado de humanos e recursos naturais…

Que não se criem ilusões, se tudo isto permanecer imutável, a longo prazo, o fim não será passível de ser evitado, e este planeta no qual habitamos e que insistimos em não partilhar com o restante ecossistema irá desaparecer, pelas mãos do próprio humano.
A luta terá de partir de nós, podemos ainda estar a tempo de acabar com o holocausto futuro, é necessária uma intervenção global de todos os indivíduos autónomos e aptos a mudarem a face desta realidade conturbada e praticamente sem solução, a nós cabe-nos encontrar as soluções onde elas praticamente não existem, procurar por entre os pântanos e as cavernas da total escuridão social, para com esforço encontrar as raras brechas de esperança que poderão permitir a alteração primordial das consciências, matriz necessária para que se despolete a essencial mudança do modo como interagimos com o resto do planeta.
Esta luta terá de ser despertada pela tentativa de alcançar a liberdade, que em termos humanos e práticos significa que temos de ser nós a produzir as necessidades essenciais para a nossa sobrevivência tanto quanto possível, e isto porque a sociedade na qual habitamos, lá por força desde nascença, representa tão só uma praga que já se alastrou de tal modo que um contacto constante com ela induziria à sua proliferação, pelo que a solução, ou parte dela, poderá passar pela criação de micro comunidades autónomas que consigam adquirir distância e independência ideológica dessa mesma sociedade acima referida. Ou seja, a evolução está no isolamento parcial e no abandono das morais, normas e dogmas que são inerentes à (des)organização do sistema corrupto que já não é passível de se alterar. É deste modo que nos soltamos das correntes do consumo e conseguimos ser auto-suficientes e capazes de reger a vida na abstenção plena da influência degenerativa das indústrias multinacionais, cuja função é corroer a autonomia que possuímos, lobotomizando-nos pela sua necessidade avarenta e canibal de adquirir poder e de ter a seus pés uma elite escravizada pelo consumo exasperado que é em grande parte efectuado pelos subjugados, fracos e incapazes de serem independentes e conscientes, e tudo isto a um nível mental, obviamente. Da mesma forma convém sempre relembrar que nos dias de hoje está incutido a ferro e fogo a cultura do descartável e do desperdício, logo os restos mais que aproveitáveis, que por alguma razão obscura e incompreensível são atirados ao esquecimento pelas numerosas identidades que fazem vénias ao esbanjamento de bens essenciais tais como os alimentos, são sempre passíveis de reciclar e reutilizar, o que implica que esta seja uma das várias técnicas que poderão ser usadas numa situação em que nos afastamos da cumplicidade directa do ciclo de destruição e letargia vigente. Temos que ter sempre presente nas nossas consciências que as pequenas acções se podem tornar em grandes acções, mesmo que só para nós próprios, e sendo assim nenhum acto, por mais insignificante que pareça, é minimamente desprezível quando se fala na tentativa de alcançar a autonomia, o que por si só simboliza a descrença nos valores inerentes ao apodrecimento social da civilização humana, sendo este portanto um aspecto crucial para nos considerarmos donos absolutos de nós próprios.

E para complementar esta ideia convém referir que a autonomia também passa pela capacidade que deveremos adquirir para acreditar nas várias formas de mudança, ou de revolução, sem o apoio de grupos ou facções idealísticas restritivas, sendo que a devoção de algo absoluto, um grupo ou ideal fixo nos seus dogmas, é o maior inibidor da liberdade que poderemos impor a nós próprios como indivíduos. A essência da liberdade passa pela crença das nossas convicções, evitando ao máximo os aglomerados que têm como mero objectivo a inclusão de sentimentos de pertença, que inevitavelmente enfraquecem e removem a força autónoma dos seus elementos, e que muitas das vezes provam somente o quão descartáveis as convicções das pessoas realmente podem ser. Considera-se como sendo autonomia o “poder” individual das ideias pessoais, não lhe atribuindo qualquer tipo de significação categórica, vulgo nome, porque esse só induz à limitação das crenças revolucionárias que poderemos ter e, eventualmente, partilhar. O estereótipo é assim excluído, o que possibilita uma maior abrangência de soluções por parte daquilo em que acreditamos, sem confrontos desnecessários derivantes do facciosismo que têm como origem a atribuição de um conceito a um conjunto de ideias, e que sem dúvida alguma prejudicam as acções que englobam a resistência libertária. Para além disto, necessitamos de adquirir a consciência de que a nossa natureza humana é a única fonte de liberdade num plano racional. Como tal, é crucial irmos contra as regras e morais já estipuladas pela fraqueza metafísica de um deus, lutarmos pelo ideal de sermos autónomos na ausência dessa falsa entidade, e não nos deixarmos enfeitiçar pelas mentiras e hipocrisias de instituições como a igreja, seja de que religião for.

É eminente o perigo da evolução e do progresso que, devido ao crescimento exponencial e descontrolado da população humana (permitido essencialmente pela robotização do quotidiano e da vida), insere-nos num plano em que teremos que suplantar a realidade mecanicista e apática de tal modo que consigamos encontrar a verdadeira revolução, que não é o progresso industrial, mas sim a tomada de consciência, por parte dos indivíduos, das consequências provocadas por esse mesmo progresso industrial. E isto porque o derradeiro perigo do uso de recursos na sociedade humana é tão só a sua industrialização desmesurada, que conduz ao rápido desaparecimento de toda a matéria-prima que é roubada aos solos deste frágil planeta. Estamos perante uma produção que vai direccionada para o descontrolo do uso abusivo dos recursos planetários, e como tal, a defesa da natureza é tão ou mais importante quando comparada com a reivindicação social das comunidades humanas, aliás, uma depende da outra, e vice-versa, logo é de absoluta urgência o desenvolvimento e propagação de uma linha de pensamentos que se enraíze na concepção de ideias que posteriormente levem à prática da contestação e da revolta, factores cruciais para que se mantenha algum tipo de equilíbrio planetário e para que ao menos as palavras da “essência” que não fala, ou seja, a natureza, se consigam exprimir para além dos cataclismos manifestados por consequência da acção imprudente das grandes corporações e da complementaridade apática das populações. A título de exemplo para demonstrar até onde vai o terror corporativo para com a natureza pode-se fazer a referência específica ao absurdo da indústria alimentar como sendo uma das principais incitadoras ao holocausto desrespeitador e imoral face à vida natural que nos rodeia. Certamente que todo o género de indústria representa uma atrocidade ao planeta, visto que consome e extrai imponderadamente a referida matéria prima, mas nenhuma assume uma posição tão directa em termos da indiferença para com o sofrimento imediato de seres vivos como a indústria alimentar (mesmo que não sendo a que mais danos provoca), já que o seu alvo desta será essencialmente a vida animal e vegetal, que são ambas “produzidas” excessivamente para satisfazer as necessidades do descontrolo e ultra consumo desnecessário da sociedade humana. Como exemplo temos a criação em cativeiro dos animais, que na sua grande maioria não chegam sequer a conhecer os solos e terrenos naturais que lhes são destinados e para os quais estão biologicamente e, poderemos até dizer, psicologicamente adaptados, sendo reduzidos ao extermínio dos campos de concentração e posterior execução massificada, onde se têm de subjugar aos maus tratos e condições impensáveis da suposta vida que possuem. Os animais são assim submetidos a uma condição de artificialidade grotesca, fabricados como mero objecto da obcecação que o humano revela pelo domínio de tudo o que é existente. Todavia, o ultraje abusivo por parte da humanidade também se reflecte na produção de matéria vegetal, veja-se, como reflexo disso, a destruição generalizada de todos os vastos campos originais da natureza, para, no seu lugar, serem replantadas zonas de cultivo, regidas por uma simetria abominante que nega o conceito de disposição originalmente aleatória, e que, como tal, nega a natureza. Porém, esse é só o prejuízo visual, porque o impacto prolonga-se até à violação de habitats inteiros, roubados às espécies que neles deveriam coexistir, dizimando assim a majestosa representação de vida e diversidade que a natureza outrora apresentava. O dano é também atribuído aos solos que são de tal modo usados para esse dito cultivo que, a longo prazo, experimentam uma exaustão que os impossibilita de produzir mais matéria vegetal. Eis outra ansiedade do humano que surge a partir da exploração do planeta terra, este, para além de construir as suas próprias fábricas altamente poluentes e nocivas (que por sua vez já necessitam de matéria prima natural), tenta também moldar a natureza à semelhança desses locais de fabrico ou produção intensiva, representando esta uma tentativa para domar o espírito da natureza por meio da mecanização que transforma tudo num aglomerado de previsibilidade. Para além destes sectores industriais, existe ainda aquele que extrai a matéria inorgânica até à sua já observada escassez, complementando assim o ciclo do absoluto desrespeito que representa a humanidade face ao local onde habita, e perante todas as evidências que nos são exaustivamente apresentadas, pergunto-me, terá esta situação de permanecer eternamente imutável, devido exclusivamente ao conformismo das maiorias?

O intuito da civilização é tornar-nos em meros autómatos cuja utilidade é a produção massificada da qual a elite exploradora poderá tirar algum proveito, é assim que eles nos querem, domesticados e entretidos com as infinitas formas de consumo que nos metem à frente dos olhos e que servem de sedativo para as consciências. As minorias da inconformidade, as que optam por abrir os olhos, são continuamente marginalizadas e oprimidas, os únicos que se importam com um futuro melhorado são alvo de exclusão e preconceito pelo facto de imporem conceitos que desmoronarão os alicerces que estagnam o presente. A imposição do sistema democrático nada trouxe que permitisse uma verdadeira mudança de consciências ao nível dos recursos naturais e dos direitos humanos e animais, a falsa liberdade prevalece, tal como a ditadura da maioria, que só beneficia os reverentes e obedientes à tirania que tenta eliminar a resistência minoritária. Porém, nunca deveremos deixar o espírito contestatário esmorecer, nem mesmo face às evidências que poderão intensificar o desânimo pela resistência, que isso seja a razão para gritar ainda mais alto de modo a que prevaleça o inconformismo para com os poderosos e despóticos que cada vez têm mais dificuldades em ocultar as novas ideias da revolução e as evidentes consequências reflectidas em todos os aspectos da sociedade e da vida generalizada. Que não sejamos nós o túmulo das últimas réstias fundamentais de esperança…

ZOMBIE BOX CONTROL

Diz-me quantas pessoas se perdem hoje em dia na procura desesperante por dimensões fictícias, estáticas no seu lugar, à frente de um ecrã hipnótico… consegues dizer-me?
A vida aleija, é verdade, as questões fazem ricochete no interior do crânio e sufocam, acredita nisso. O que fazer, o que dizer, o que… ser e sentir, ninguém o sabe realmente. A ansiedade corrói-te o cérebro e dá-te a volta às entranhas, repentinamente gritas para ti mesmo:

– “VÁ LÁ! QUERO MAIS UMA DOSE!
Onde está o sedativo que tanto preciso?”

Ligas a caixa que trás apatia ao domicílio, já não é preciso fazer nenhum esforço para existir e de imediato deixas de pensar, tão fácil, sorris ao veres vidas perfeitas e vazias, ficas com cara de imbecil face as guerras que passam em directo, calamidades sociais à distância de um click do comando, é bom para as audiências!
Chegou a altura de mudar o canal, o sofrimento dos outros povos começa-te a aborrecer, o que mais anseias agora é pelos simulacros de vidas onde tudo acontece como devia, onde todas as personagens têm quotidianos fantásticos e previsíveis, tu sentes o tédio a alastrar-se novamente, mas que se foda, a vontade de fazer alguma coisa entrou em completa dormência, já nada interessa, nem te apetece abrir os olhos, só querias era uma maneira de te espetarem esse lixo intravenosamente…

– “P’RÁ MERDA COM A SANIDADE!
Somos todos senis mesmo, o que importa?”

O que importa realmente… por que razão pensar, por que razão agir? Basta sentares-te no sofá o dia inteiro para que te projectem nos olhos as irrealidades apodrecidas na sua pseudo perfeição que todos parecem engolir como se fosse alguma coisa que realmente valesse a pena desejar-se. Ligas o botão e sentes as pressões frustrantes a dissiparem-se como se nunca sequer tivessem existido, para quê saber da existência de um mundo lá fora atrás da janela, com todas as suas complicações e preocupações, se tens esse instrumento zombificador que atira o teu cérebro para um estado de extrema letargia que já te viciou faz tempo, é assim que eles te querem, moldável e manipulado, mas nem sequer sabes da existência “deles”… deixa estar, acredita nas ilusões que te injectam directamente no cérebro por meio das imagens emitidas na tua sala, acredita na verdade que as fábulas televisivas te contam, ninguém te controla realmente, a existência de oprimidos e opressores é uma invenção de lunáticos que não arranjam outro pretexto para descarregar o seu rancor sem fundamento, sim, o Jornal das 8 disse-te isso, logo deve ser verdade, não é? Olha! As grandes corporações querem salvar o mundo apesar de serem forjadas na ganância, é tudo tão bonito, a publicidade é linda e as merdas consumistas que te impingem sem descanso têm todas elas a sua utilidade mais que necessária! Deseja-as inconsoladamente enquanto não as possuíres, anseia por elas como se a tua vida dependesse disso, é o que eles te dizem para fazeres…

A miséria dos outros dá-te tesão e eu quero é que te fodas.
Tens duas opções, acorda dessa ilusão ou vai morrer longe… e mesmo que de qualquer das formas te safes, continuarei a achar que por dentro já o estás.
_______________________

ODE AO TRIUNFO HUMANO

Invólucros vazios que pela inacção são possuídos, ex-humanos que pelo tédio foram oprimidos, novos seres mecanizados à alienação submetidos, criaturas que se rejubilam com a miséria dos outros, ansiando em apodrecida dormência por um desfecho declarado da sua própria existência numa realidade onde pouco mais restará para além das ruínas deixadas por esta guerra da obscura ganância humana…

E mesmo depois de tudo estar já reduzido ao indizível vestígio da mais que completa aniquilação das mentes do marasmo civilizacional, ainda assim me questionarei…

Existirá alguém que ainda se importa com isto?

CIDADE VENENOSA

Tentando a distância momentânea da minha mente ao sítio inundado de incompreensões e confusas interpretações onde as algemas mal se vêem mas onde porém todos se escravizam sem darem por isso...
A cidade, que sentimentos gélidos e macabros transbordam constantemente deste território imundo, sente-se a todo o momento e em cada esquina o frenesim cansativo que não acaba nunca, os labirintos de cimento e asfalto perdem-se num emaranhado complexo de mesquinhez e arrogância humana onde frenéticos andam os autómatos que assassinaram a vida. A confiança no desconhecido que seduz venenosamente tornou-se na perdição dos desatentos e as concepções do perfeito fictício bombardeiam-nos até à exaustão do nosso cérebro, viras os olhos e em qualquer lado lá está a propaganda que te conduz à loucura do consumo se não fores prudente. Amaldiçoada seja a cidade e os seus venenos que emanam das torres cinzentas de destrutiva produção febril massificada, ela alastra-se como uma praga e usa a natureza para dela fazer um festim de aço e fumos, necessita por instinto de espalhar os seus artifícios que transformam mentes nos depósitos descartáveis que habitam colossos de electricidade e agonia.

As luzes artificiais e a claridade que remove a noite tornaram-se na cegueira das máquinas que dizem ainda serem pessoas, os pensamentos corrompem-se pelo intenso movimento que não cessa e todos festejam a imagem do progresso furioso e em rejúbilo, pisando os restos das planícies e dos bosques agora em fogo e servindo de combustível. Não existe pior visão que uma chacina tornada em mecanização, o animal comum deixa de nascer e a sua vida desconsidera-se ao nível de um produto, a sua liberdade é transformada no alimento dos aglomerados que não encontram nenhuma vontade em ver saciada a ira que com a evolução trouxe um pretexto para destruir a harmonia natural dos campos e das florestas que outrora repousavam no seu sossego livre da sentença fatal que se tornou a civilização humana.
O tal progresso avança e infiltra-se no planeta lentamente… ouve-se o ranger atroz da criação maldita e o insuportável odor mecânico preenche-me as narinas parecendo querer infectar-me o cérebro com as substâncias tóxicas que pairam na atmosfera. Por todos os lados cercam-me os sinais deixados pelos cérebros da destruição massiva, são os anunciadores da voracidade insaciável de tudo o que existe em nosso redor e que à semelhança de uma tortura que vagarosamente se arrasta fazem sangrar o planeta terra com os seus desleixos sarcásticos e ímpetos de terror...

Eis a arma da total aniquilação, a cidade que contamina o humano, nada mais que isso, uma explosão fria e lenta de artificialidade, coberta por nuvens de obscurantismo que induzem os seus habitantes a acreditar que tudo terá solução mesmo não fazendo absolutamente nada para que esta surja. Os placares brilhantes e as montras onde se expõe a letargia consumista das massas são distracção suficiente para que tudo pareça estar sobre um controlo superior que nunca permitirá o colapso humano, mesmo apesar de que a verdade que ninguém alcança é que somente as mentes civis estão sobre o controlo de algo superior, pelas piores razões que se possam imaginar.

Diariamente se observa o desfile macabro de “coisas” alienadas que se afundam na sua rotina, parecem um exército monocórdico de robôs prontos a marchar para a morte dentro da vida, acessórios uniformizados pelas tendências capitalistas, ferramentas catalogadas numericamente que se iludem pensando ter a sua palavra ouvida por aqueles que os oprimem e que simultaneamente afirmam ser o messias salvador de toda a população e seus futuros descendentes mas que na verdade não passam de imperialistas que constroem o seu reinado num marasmo de hipocrisia a céu aberto.
A marcha da rotina caminha e assim se ouvem os seus paços, todos tão conformados, que lindos animais domesticados me saíram… venderam a autonomia numa loja de penhores à procura de concepções exageradas do pseudo conforto burguês que é o raquitismo mental do comum cidadão. Acreditam piamente que trabalham para um bem comum e que todos os órgãos políticos que os gerem têm um intuito benevolente de lhes proporcionarem a melhor vida possível, mesmo apesar de que estes se limitam a atirar o proletário para a trituradora social onde o capitalista citadino vê cumprido o seu desejo civilizacional de completo separatismo das classes hierárquicas. As divisões entre vidas alargam-se enquanto que a solidariedade comunitária se dissipa e todos impávidos observam ao compasso mortífero da cidade industrializada alastrando como um animal descontrolado que foi possuído pela maldição de não ver saciada a sua fome destrutiva, seja de que forma for.

O deus cibernético esconde-se por ai, aprisionando digitalmente tudo e todos sem que ninguém saiba quem realmente o controla… será o Estado? O Consumo? O Humano? O progresso torna-o ambíguo na sua compreensão e infiltra-o silenciosamente nas nossas vidas, desta forma a dependência da tecnologia transforma-nos em escravos das corporações capitalistas que nos apagam da mente o que somos por origem, porque mesmo não parecendo, nós somos mais que apêndices do aço construído nos alicerces desta evolução obscena. Chega de números e catálogos e utensílios da treta que não servem absolutamente para nada, existe outras formas de agir e pensar, porquê a dependência com a cidade em forma de pensamento e acção? Existe mais felicidade para além do consumo, e infelizmente raros são os ditos “evoluídos” que o sabem! Querem-nos fazer acreditar que tudo se desmorona não fossem as ferramentas que nos silenciam através das correntes urbanas, mas há mais para além disso, há uma dimensão palpável para além da artificialidade e dos contornos alcatroados que delimitam o presente conceito corrompido de existência… da nossa existência!

Basta olhares para além das irrealidades que te querem impingir à força… e talvez te livres de ser mais uma máquina humana contaminada pela estagnação do pensamento!

Sem comentários: